terça-feira, 7 de outubro de 2008

Irmão Victor!

Um pedestal térreo, cortado,
ombreia com as montanhas,
capitaneia o vale ancorado;
canta os feitos e as façanhas
do instante e do esperado.
De Cachéu, dizem,
veio o irmão Victor.

Com espartana disciplina,
desagrada todos os gregos,
para os troianos não se inclina.
"Olhai e vede, não sejais cegos"
pouco fina, mesmo pouco fina
a voz que, sobrepondo o ceremonial,
vocifera " profundamente colonial".

Livre, estóico, quase peripatético;
solto, irmão, dado à amizade, bem querer;
ermitão, nas horas vagas, nada de ascético
eudaimonia é tudo o que quer.
Leal ao self e arrojado no desafio.
É o meu irmão Victor.

terça-feira, 29 de julho de 2008

A felicidade e práxis humana (Ética a Nicómaco).


É sobejamente conhecida dos estudiosos de Aristóteles a íntima relação que o Estagirita estabelece entre a felicidade e a acção humana no primeiro capítulo da Ética a Nicómaco. Aí a felicidade é concebida como sendo o bem supremo que pode ser obtido através da acção. Ser feliz é agir bem. Daí a estreita relação entre a felicidade e a actividade da alma dentro do quadro de uma excelência completa.




Á custa de um hercúlio esforço e de um labor académico notável, o Professor António de Castro Caeiro (UNL) presta um serviço memorável aos leitores do português trazendo ao convívio dos mesmos a primeria tradução portuguesa a partir do original grego de um dos mais importantes legados escritos de Aristóteles - Ética a Nicómaco. Nas palavras do tradutor da obra em causa, é "dificil exagerar a influência de Aristóteles na cultura ocidental". Tal é um facto incontestável que se torna muito claro, por exemplo, quando se lança o olhar para o universo académico, intelectual, cinetífico-cultural da ocidente medieval. Aristóteles é para alguns "o Filósofo" e é, em muitas temáticas, a bateria apontada contra o paradigma neo-platónico-augustiniano; Aristóteles é o ponto da discórdia no âmbito da exegese e da hermenêutica nas universidades que então davam os primeiros passos, mantém um peso considerável na chmada via moderna, muito idnetificada com o nominalismo e surge, de certa forma, como o mal amado da Reforma luterana ... e por aí fora. Portanto, o discípulo de Platão, tutor de Alexandre, o Grande e o fundador do Liceu tem vindo a marcar uma presença assídua nos grandes momentos da culutura ocidental.




A forma como ela aborada a relação entre a felicidade e a acção humana não deixa de ser ser pertinente para abrir horizontes de reflexão. As passagens citadas foram extraídas da referida tradução de António Caeiro, edição revista e melhorada, Quetzal Editores, 2006.



A felicidade como dimensão teleológica da acção humana.


“Quanto ao nome desse bem, parece haver acordo entre a maioria dos homens. Tanto a maioria como os mais sofisticados dizem ser a felicidade, porque supõem que ser feliz é o mesmo que viver bem e passar bem”. Ética a Nicómaco I, IV 1095a 14.

“Para uns é alguma daquelas coisas óbvias e manifestamente boas, como o prazer, a riqueza ou a honra; para uns é uma coisa, para outros outra – muitas vezes até para o mesmo podem ser coisas diferentes. Para quem está doente é a saúde; para quem é pobre, a riqueza. Tendo consciência da sua própria ignorância, muitos dizem ser coisa de monta, muito acima das suas capacidades, e que eles admiram. Alguns pensam ainda ser algo de bom em si próprio que vai para além de muitas coisas boas, mas que é o fundamento responsável pela presença da bondade em todas elas” (Ibidem).

“Na verdade, simplesmente completo é aquele fim que é sempre escolhido segundo si próprio e nunca como meio em vista de qualquer outro. Um fim deste género parece ser, em absoluto, a felicidade. De facto, nós escolhemos sempre a felicidade por causa dela mesma, e nunca em vista de um outro fim para além dela. […] A felicidade parece, por conseguinte, ser uma completude plena e auto-suficiente, sendo o fim último de todas as acções possíveis” I, VII, 1096a -1097b1.

“O sentido fixado por nós concorda com aqueles que dizem que a felicidade é a excelência ou uma certa excelência. O sentido de felicidade é uma certa actividade em exercício de acordo com a excelência. Isto é, não é pequena a diferença entre um bem supremo que existe como mera possibilidade e um bem supremo que está efectivamente em uso”. I, VIII, 1098b9.

“Que é que impedirá, pois dizer, que feliz é aquele que acciona uma actividade de acordo com a excelência completa e está suficientemente equipado com bens exteriores não só durante o tempo ocasional mas durante todo o tempo de vida?”. I, IX, 1101 a1.

terça-feira, 28 de agosto de 2007



O sopro que me acompanha
No início, diz a narração genesíaca,
Pairava sobre as águas
O sopro que me acompanha

Na minha idade pueril
O cantar do vento era uma ensurdecedora
Polifonia, que soprava no centro da
Nesónica porção de terra.
Terá sido a fúria de Éolo?
Se o sopro era do filho do Poseidon, não sei.
Lapidar é o rótulo com que o poeta nos deixou
“Somos os flagelados do vento Leste”.

O sopro que vira o curso do herói de Ítaca
E faz tremular as fundações do mundo,
Não me convenceram.
Uma vez abraçado ao escândalo da cruz
Fui-me apercebendo de um outro sopro.
O profeta no alto do monte, não esperava ver
Na brisa suave, a presença do Altíssimo.
Eis o sopro que me acompanha.

Quando a sinfonia do pneuma da natureza
Se faz ouvir na minha janela e com a
Sua suavidade acaricia a minha face
Maculada de prantos perdidos,
Não posso deixar de ser gentleman
E vir até à linha do sinérgico horizonte
Onde o altíssimo a todos se revela.
Na partida e na permanência do Uno e Trino
Ficam-me a certeza de um destino quadripartido
Que culmina num bafejar pelos quatro cantos do universo
E o regresso ... um dia. Não do juiz mas do redentor,
de um sopro sempre adélfico

A razão pede-me bom senso no estrebuchar das emoções;
A esperança aconselha-me desafiar o tempo
E a manter-me de pé até que a boa nova do
Novo sopro me venha aconchegar.
Então, o holístico, o fenomenológico e o real
E o fideísta se abraçam na certeza do esperado.

"Os sonhos são como o vento,
Sentimo-los, mas não sabemos de onde
Vêm nem para onde vão” – sentencia Augusto Cury.
O sopro que me acompanha
Vem da Essência e para lá caminha.
É a Essência

A natureza inala e exala. Bafeja.
No novo regresso viaja o pólen que
Ao ritmo do sopro vai cumprindo
A tarefa da renovação do ciclo da vida.
Eis a minha relação (de um certo dinamismo)
Com o sopro que me acompanha ao ritmo do
Dramatismo especulativo, que é a própria
Existência humana.
O sopro que me acompanha
Aconselha-me que o Cordeiro está imolado.
Tal faz de mim justo. Apenas me é pedido
Que seja estulto para o mundo
E creia no sopro do amor.
Nem na aventura do crer estou sozinho
Nada tenho que não recebi, ensina-me
O Apostolum ad gentes

domingo, 19 de agosto de 2007

Sim, dizia eu, sou poeta!


Sim, dizia eu, sou poeta!

Dizia eu, sim sou poeta!
Nasci perto das montanhas estéreis
Que não param de parir pedras.
A pátria não me chegou, requeri o Cosmos;
Diante de mim só vejo uma estrada aberta
E uma multidão errante que questiona
E disserta sobre o sentido da antropodisseia.

Porventura isto faz de ti poeta?
Acaso lês a intenção dos ventos?
Cantas hinos imortais e escreves
Versos que prometem extasiar gerações?
Levas impressas na alma as angústias do teu povo?
Porque reclamas ser poeta? Perguntámos nós!
Saberás o que é ser poeta? Perguntámos nós!

Sim, dizia eu, sou poeta!
Na aldeia onde nasci a geração é de víbora e serpentes!
As montanhas frustradas e as ribeiras desenganadas!
O sopro do vento desgastado e dissonante!
O que hei-de cantar? Tristezas de um povo néscio?
Angustias de uma natureza magoada pelo infortúnio?
Não! O coração do poeta se recusa a fazer tal coisa!

Por ventura isto faz de ti poeta?
Não serás antes um cobarde
Que recusa enfrentar as adversidades?
Qual é o poeta que não se identifica com o seu torrão pátrio?
Qual é a lógica que norteia a tua vida? Perguntámos nós!
Quem és tu? De onde vens e para onde vais?
Que nos tens a dizer? Perguntámos nós?

Dizia eu, sim sou poeta!
Porque hei-de amar uma pátria-masmorra?
A ilha é para mim uma prisão e o mar seu carcereiro.
Qual é a lógica que norteia a minha vida? Perguntais vós!
É a ausência da lógica, eis a minha resposta!
Amo por amar e vivo por viver
Eis a minha grande animação!

Quem sou? De onde venho e para onde vou?
Perguntais vós, intimados pela lógica racional!
Nem se quer sou! Aspiro a ser! Confusos?
Nem de todo existo! Participo da existência Daquele que é!
Venho do Ser e vou para o Ser! Intrigados?
A pátria não me enforma e nem aceito tal identidade.
Ah! Sim, sou poeta continuo a dizer!

Porventura isto faz de ti poeta?
Continuais vós a discorrer! Pelo menos sabes fingir?
É a vossa derradeira dúvida!
Não sei fingir, mais sei fingir que finjo. Tenho vontade, expressão do ser.
Imagino o inimaginável e lanço nos horizontes do desejo
A vontade de saber ser livre, a vontade de crer para entender.
A vontade de ir dizendo, “Sim, dizia eu, sou poeta!







sábado, 18 de agosto de 2007

Elogio da partida


Anda daí, ó profundeza do meu ser.

Que te prende, ó brando e próspero íntimo do meu ser?
Olha a aurora que desabrocha sobre os mortais;
Parte quem parte, chega quem chega.
É só mais uma odisseia, nosso engodo.
Anda daí, façamo-nos ao fado!
O anseio do poeta é contigo desancorar,
Ir para bem longe de tudo e bem perto de nós!
Que te prende, ó brandura do meu ser?

Diz-me tu, ó poeta inconsequente!
Que de mim fizeste uma anima perigrinans.
Porventura não aprendeste com o sábio antigo
As turbulências da exercitatio animi?
Vim das entranhas daquela gens tenebrarum
Afeiçoei-me aos abraços da Velha Torre;
E almejo as carícias das águas do rio Munda…
Não me peças para partir, tudo menos isso!

Deixa-te disso e anda daí, vem comigo.
O topo do Setentrião nos aguarda expectante.
Lembra-te do baile no florir da aurora
Que é o cadenciado peneuma dos imortais
Heróis do Kalevala, por entre as folhas viçosas
Das fabulosas árvores, produzindo a sinfonia
Ao som do qual a azul Cruz latina, desposa
O imaculado tecido branco e dançam o futuro.

Não compreendes, pois não?
Olha para o outro lado da margem.
No Ninfeu tudo é sufocado e sombrio!
As Ninfas animam a rainha Nina, que
Já não vem ao porto abençoar os desancorares,
Nem vagueia pela montanhas, seu domínio, e,
Muito menos lança a sua bênção ao Luar.

Anda daí, não me venhas com conversas mórbidas!
A rainha está habituada às partidas e tu também!
Já te disse, parte quem parte, chega quem chega!
E que tal levares a Rainha e a Velha Torre nos
Mais cálidos dos teus recantos? Que dizes?!
Partimos e ficamos, tal como a Rainha fica e parte.
No deambular dos lagos e na Aurora Boreal vê-la-emos;
Que ela nos enxergará no vagabundear do Munda.

Se podemos contar com o sorriso imortal da minha Rainha
E abraçar a Velha Torre, vou num instante ao Ninfeu
Buscar uma estrela de fogo que nos alumiará nas asperezas
Do caminho que havemos de construir na graça da Via universalis.
Não só vou contigo nesta aventura
Mas também contigo canto o elogio da partida.
Parte quem parte, chega quem chega!
Parte quem parte, chega quem chega!










A maldita escola dos meus (II)


A terra de leite e mel,
Não é do secular, nem com ela
Sonho nessa antropodiceia.
Na estranha escola dos meus
Anseia-se pela unidade,
Mas a sementeira é a discórdia;

Como percebo o aureolado antigo;
O filósofo berbere para quem
A pátria se tornou exílio.
Na escola dos meus a minha esperança
Não se verga perante vontades alheias;
Nem do tortuoso, nem do nivelado;
Nem do douto nem do néscio.

Na escola do meus
Não seguirei o Taciturno de Orange;
Nem abalarei as colunas do vento.
Os vitupérios começam a ter sabor de vitória
E o meu modo de falar será “sim, sim, não, não”
É o que me pede o jovem Galileu.

A maldita escola dos meus (I)

A maldita escola dos meus

O berço do poeta, dizem eles,
Encanta, simplesmente encanta.
Encanto não vislumbro e a honra
Que associam ao meu berço
Nunca se me revelou familiar.
O que se passa?

As duas montanhas blindadas de pedra
Escamoteiam o mal radical;
Distorcem, à maneira dos filhos dos homens,
As inverdades que reclamam ser verdades.
E quando pergunto “de onde vos vem tal habilidade?”
“Aprendemos na escola dos teus” é a resposta habitual.

As colinas, despidas de pudor;
Lançam um olhar vulpino
Sobre o meu desconforto
Na esperança de me seduzir e ganhar
Para as fileiras da mentira e da inimizade.
Com honestidade apenas dizem: “tudo isto
Aprendemos na escola dos teus”.

Os vales secos de honestidade
Apressam-se a seduzir os recém-nascidos
E com destreza os apetrecham para lidarem
Com as acusações do poeta que lhes imputarão vexame.
Os vales, estes também se desculpam: “tudo isto
Aprendemos na escola dos teus”.

Não assimilando a escola dos meus;
Ensaio o rugir do felino plenipotenciário
Desconhecido das montanhas, das colinas e dos vales
Cativos da escola dos meus negados.
Vituperando os meus negados dizem
Que querendo ou não este é o meu berço.

Abisit. Ao poeta é conferido a virtus e a
Voluntas de escolher e modelar o berço e até de
Negar a escola dos seus.